quarta-feira, 30 de abril de 2008

A PRODUÇÃO HISTORIOGRÁFICA NO SÉCULO XIX

Simone Rodrigues Gondim[1]
Francisco Antonio da Silva, Professor do Curso de História (FAFIDAM/UECE)


RESUMO
O artigo trata da produção historiográfica produzida no Brasil no século XIX, sob a influência do IHGB (Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro). O Instituto é criado em 1838 com o objetivo de construir uma identidade nacional para atuar tanto externa como internamente. As produções são influenciadas pelos parâmetros de trabalho fornecidos pelo IHP (Institut Historique de Paris ) e pelo caráter conservador do IHGB que está ligado as autoridades, principalmente D. Pedro II. A revista do Instituto também será um meio de difundir o projeto nacional de construir um perfil para a nação brasileira através da produção da História do Brasil.
Palavras – Chave: IHGB, produção historiográfica, projeto nacional, identidade nacional.

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O século XIX é considerado o século das ciências, pois foi durante esse período que todas as áreas do conhecimento ganharam status de ciência, inclusive a História. A partir de então, o discurso historiográfico ganha foros de cientificidade onde passa a seguir o rigor exigido pelo meio acadêmico. O historiador ganha o título de pesquisador igualando-se aos demais na produção científica.
Neste momento tenta-se reunir o maior número possível de documentos, tanto antigos como atuais, para produzir o conhecimento histórico com valor científico. A História precisa ser vista como ciência. Por isso os historiadores produziram obras com o máximo de imparcialidade sem expor qualquer opinião sobre o fato abordado. E influenciados pela escola histórica alemã[2], essas produções apresentam-se ao estilo da monumenta germinae historica, na tentativa de narrar o passado tal como ele foi, a partir dos documentos que é a única comprovação para o seu discurso.
Esse processo ocorrido na Europa é acompanhado pelo Brasil com a criação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) em l838. Este é o lugar de onde partiu a produção historiográfica caracterizada pela marca elitista, herdeira da tradição iluminista. O discurso produzido pelo Instituto contribuiu na construção da Historiografia Brasileira e das visões e interpretações à cerca da discussão da questão nacional.
O Instituto é criado na incumbência de cumprir a ardorosa tarefa de delinear um perfil para a Nação brasileira. As produções historiográficas tinham uma função pedagógica de orientar as novas gerações para o patriotismo, baseando-se no modelo dos antepassados, utilizando assim o conceito de história como mestra da vida. Faziam produções biográficas com o intuito de fornecer exemplos e construir heróis nacionais. Assim definia a Nação brasileira nos moldes organizadores da vida social do século XIX, dando-lhes uma identidade própria capaz de atuar tanto externa como internamente.
Segundo Manuel Luis Salgado Guimarães, ao definir a Nação brasileira enquanto representante da idéia de civilização do Novo Mundo, estava também definindo aqueles que internamente ficariam excluídos deste projeto por não serem portadores da noção de civilização, no caso o índio e o negro. Isso devido ao estilo conservador do IHGB, ligado as autoridades, das quais recebe favores, especialmente de Dom Pedro II. Portanto, o seu conceito de Nação se restringirá aos brancos sendo carregado de imagens depreciativas do “outro”, cujo poder de reprodução e ação extrapola o momento histórico de sua construção. Externamente essa discussão sobre o “outro” desta Nação se dará a partir de critérios políticos das diferenças, ou seja, o Brasil terá como inimigo as republicas latino – americanas caracterizando a forma republicana de governo como sendo uma barbárie. Ora se o Brasil tinha proclamado sua independência tornando-se um império governado por portugueses, eles não poderiam exaltar as repúblicas americanas, pois estariam se contradizendo e colocando-se contra a continuidade de Portugal, não sendo este os seus objetivos.
Devido à influência do Institut Historique de Paris os nossos historiadores utilizaram a concepção de historia herdeira do Iluminismo, que trata a história enquanto processo linear marcado pela noção de progresso. Por isso, utilizaram outras áreas do conhecimento como a Arqueologia, a Lingüística e a Etnografia para abordar os índios em suas obras colocando-os em posição inferior. Utilizando argumentações científicas para comprovar a sua inferioridade em relação aos brancos e que a civilização só viria com a presença branca no continente.
A tarefa pretendida pelo IHGB refletia-se em suas produções. Todos produziam trabalhos nessa linha influenciada pelo IHP (Institut Historique de Paris) que fornecia os parâmetros de trabalhos historiográficos ao IHGB. Não só no projeto ideológico, mas também político. Assim construía o ideal de nação não só internamente para que houvesse uma identificação nacional do povo com a monarquia, mas também externamente para colocar o Brasil em pé de igualdade com as outras Nações. O objetivo era escrever a história do Brasil para construir uma identidade nacional que era legitimado pela elite letrada imperial contribuindo para uma progressiva difusão e homogeneização do projeto nacional.
Um outro meio utilizado para difundir esse projeto foi à revista publicada pelo IHGB, que é editada desde a sua fundação. Em suas publicações ela trazia documentos básicos, atividades da instituição, divulgação das cerimônias e atos comemorativos como também a publicação das produções dos historiadores brasileiros. Ela é a expressão mais nítida da linha de trabalho seguida pelo IHGB. Segundo Manuel Guimarães havia três temas recorrentes na publicação da revista: a problemática indígena, as viagens e explorações científicas e o debate da história regional.
A problemática indígena era um tema que se fazia mais presente nos debates que tratavam da tarefa de construção da Nação. A questão era qual seria o lugar das populações indígenas no projeto nacional. Já que o projeto envolvia o processo de integração física do território e a discussão relativa às origens da Nação. Essa discussão levou alguns historiadores a definir um saber sobre essas populações para que se tornasse memória para se fixar e depois transmitir. Já havia um intenso debate entre a historia e a literatura a cerca do índio ser considerado o representante da nacionalidade brasileira. A literatura já o havia tomado como representante nacional, mas a história via problemas em adotar essa questão. Não condizia com o discurso da elite que predominava no Instituto.
Uma solução apontada foi a criação de um projeto indigenista para o Estado. O que se pretendia fazer era uma nova catequese onde os indígenas teriam que ter contato direto com os brancos, educar seus filhos nos princípios da educação branca e incentivar a miscigenação como forma de branquear a população indígena. Seguindo assim o modelo de usar experiências passadas para solução de problemas atuais. Alguns historiadores vão explicitar aspectos parecidos como a necessidade de integração dos grupos indígenas no projeto nacional da construção da Nação; defesa do comércio e da educação como um meio de contato com os índios, ou seja, utilizá-los como mão-de-obra em substituição aos negros; destinar um papel ao Estado para que com a ajuda de ordens religiosas possa solucionar essa questão sem deixar de explicitar seu espaço de controle sobre o desenvolvimento do trabalho.
O segundo tema abordado tanto pela revista como pelas publicações historiográficas é sobre as viagens e explorações do território brasileiro. A abordagem é feita em cima das questões de fronteira e limites, e riquezas naturais do Brasil. Trata-se de descrever geograficamente o país. Conhecer o território nos seus mínimos detalhes para fazer um levantamento do potencial de cada região avaliando as possibilidades de integração econômica entre elas. Todas as regiões são consideradas importantes, mas existiu uma preocupação com as regiões de fronteira devido a necessidade de integração dessas regiões com o poder do Estado e também devido aos conflitos que existiam desde o período colonial. Com esse levantamento tinha-se a produção da história de cada região constituindo um dos temas abordados pela produção historiográfica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscar a identidade física da Nação observando as possibilidades de exploração econômica do território e a integração das regiões com o Estado são os objetivos pretendidos para ajudar na construção da historia do Brasil. Essa historia servia para que o poder monárquico tivesse conhecimento total do seu império em todos os seus aspectos: físicos, políticos, econômicos, culturais e ideológicos. As produções do IHGB estavam a serviço do império, já que Dom Pedro II era seu maior bem feitor.

[1] Aluna do S-VII do Curso de Historia da FAFIDAM – Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos da UECE – Universidade Estadual do Ceará – Limoeiro do Norte.
[2] Em 1819 foi constituída a Sociedade para o Conhecimento da Antiga Historia Alemã, em Frankfurt, que teria como objetivo editar todas as antigas fontes da historia da Alemanha.

BIBLIOGRAFIA

GUIMARÂES, Manoel Luis Lima Salgado. Nação e Civilização nos Trópicos: o Instituto Histórico Geográfico Brasileiro e projeto de uma história nacional. Disponível em www. cpdoc. fgv. Br. revista / asp / dsp – edição. asp? cd – edi= 5, acesso em 26/02/2008.
IGLÉSIAS, Francisco. Os Historiadores do Brasil: capítulos de historiografia brasileira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, Belo Horizonte, MG: UFMG, IPEA, 2000.

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